terça-feira, 26 de agosto de 2014
Segundas intenções
sábado, 16 de agosto de 2014
O cemitério da colina
Esses
dias, vi uma mulher lavando um túmulo. Lembrei-me de do Machado de Assis:
túmulo limpo com frequência mantém a morte recente (parafraseei). É um
pensamento do Conselheiro Aires, quando de sua ida ao cemitério, com a irmã, Rita.
Configura-se uma limpeza melancólica, então. Mas, e quando não há limpeza
nenhuma? A morte seria uma ferida cicatrizada? Ou apenas uma forma diferente de
melancolia, tendo em vista que a sujeira concederia às lápides tons de desleixo?
Para a sociedade contemporânea
ocidental em que vivo, seria moralmente mais “bonito” que os entes não mais
presentes tenham sua última morada sempre renovada, pois o gesto demonstra o
carinho que os vivos ainda possuem por seus mortos. O túmulo é um aporte, um
estímulo para que a memória continue falando de quem faleceu.
Por isso, a segunda categoria que
citei pode ser vista com maus olhos. Quem não preserva as sepulturas dos seus,
não se lembra mais deles.
E o que dizer de um cemitério
inteiro sem visitas? Conheço um. Há anos ele foi descoberto (em todos os
sentidos), à beira de uma estrada, no alto de uma colina. Foram fazer limpeza
de terreno, para obras ligadas à rodovia e lá estava ele, escondido entre
arbustos e grandes árvores, pequeno. Virou notícia de jornal. Órgãos públicos e
privados o limparam e revitalizaram.
Como passo por lá com certa
frequência, percebo que o mato está tomando conta de novo, o que mostra que o
cemitério da colina (escolhi este nome, que tal?) continuou sozinho. Talvez,
como ele está desse jeito, sabe-se lá desde quando, os vivos, ou já esqueceram,
ou fizeram um pacto silencioso de deixa-lo lá, quieto. Mas é importante que
ninguém quebre o acordo, porque se um levar flores ou fazer lavação, ficará
feio para os outros, displicentes. Em grandes cemitérios, cidades do além, tal
prática seria inviável: difícil agregar muita gente em uma combinação.
Sou meio machadiano, acho. Penso que
o local do último repouso pode reter marcas do tempo, indicando uma espécie de
velhice natural, que em vida todos temos. O cemitério da colina estava nesse
caminho, mas tomou uma injeção de botox.
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